Dominick Donk, um barbeiro crioulo que todas as quintas-feiras ‘leva esperança’ aos sem-abrigo em Portugal

Tem 28 anos e é um profissional de sucesso em Portugal. Dominick Donk tem duas barbearias - uma no Porto e outra em Vila Nova de Gaia - onde é procurado por jogadores de futebol e artistas, mas semanalmente o jovem não se esquece de quem não tem condições financeiras para pagar.

Reside em Portugal há cerca de 10 anos, onde Dominick Donk, natural do concelho de Calheta de São Miguel, interior da ilha de Santiago, é proprietário de duas barbearias, um espaço de restauração, bem como uma marca de vestuário. Há cerca de cinco anos que todas as quintas-feiras à noite, juntamente com a sua equipa, sai às ruas da cidade do Porto para cortar o cabelo dos sem-abrigo. A história deste cabo-verdiano já foi retratada pela televisão portuguesa SIC.

“Sinto-me privilegiado por ter nascido em Cabo Verde, principalmente no interior da ilha de Santiago, onde dormíamos com a porta aberta, onde a simplicidade é a principal característica das pessoas, onde convidamos as pessoas na rua para entrar e beberem uma água ou um prato de comida. (…). Foi assim que vivi a minha infância, foi isso que aprendi e que carrego no meu sangue.”

…Cresci num bairro complicado – Casa Lata – onde o certo e o errado se misturavam

Mas foi no dia-a-dia turbulento na cidade da Praia, numa época, que segundo diz, a capital do país estava no auge da problemática da delinquência juvenil, que Dominick começou a dar os primeiros passos enquanto barbeiro.

“Cresci num bairro complicado – Casa Lata – onde o certo e o errado se misturavam. Só para ter noção, metade dos jovens que jogavam bola comigo na minha infância hoje em dia ou estão mortos ou presos na Cadeia de São Martinho. (…) Entre 2011 e 2012, quatro dos meus amigos perderam a vida, inclusive um faleceu nos meus braços”, recorda.

Nessa altura não existia uma barbearia em Casa Lata – a mais próxima ficava em Palmarejo – e para evitar o atrito entre grupos rivais, Dominick era “obrigado” a cortar o cabelo aos jovens do seu bairro. “Fazia mais para não ganhar opressão dos thugs da minha zona do que para receber algo em troca.”

Em 2012, aos 18 anos, surgiu-lhe uma oportunidade para mudar de vida, rumou para Portugal e passou a ver a barbearia com outros olhos. “Comecei a pensar e a ver a profissão como uma solução para a vida.”

Trabalhou em algumas barbearias para aperfeiçoar o talento que descobriu aos 15 anos. Em meados de 2017, abriu o seu primeiro espaço “Dominick Donk Barbershop”, que atualmente é bastante requisitado por jogadores de futebol, artistas, etc. “O meu destaque é graças ao meu trabalho diferenciado, a nível artístico, e a alegria que existe dentro de mim, que expresso na minha forma de trabalhar”.

Em 2020, em plena pandemia da covid-19, o jovem empresário lançou uma linha de vestuário “Dominick Donk Merchandise”, que, segundo diz, tem tido boa repercussão. “Já chegamos a vestir jogadores de Manchester United, Futebol Clube do Porto e da seleção de Cabo Verde. Tem tido boa repercussão”, diz em entrevista.

No ano passado, Dominick decidiu expandir o negócio e abriu uma barbearia no centro de Vila Nova de Gaia. Em simultâneo, inaugurou um espaço de convívio, bar e restauração denominado “Donk Lounge”. “É um espaço onde expressamos a nossa morabeza, cabo-verdianidade, alegria e música”, explica e diz que atualmente emprega cerca de 20 pessoas de várias nacionalidades.

“Quintas-Feiras Mágicas”, mais do que um ato social

Há cerca de cinco anos, como forma de retribuir o que a vida lhe tem proporcionado, Dominick Donk criou o projeto “Quintas-feiras Mágicas”. Todas as quintas-feiras à noite, juntamente com a sua equipa, sai às ruas para cortar o cabelo aos moradores de rua. “O projeto parte da minha essência natural de servir o mundo e de fazer o bem para todos, de ajudar.”

Em entrevista, o barbeiro diz que inicialmente foi complicado ganhar a confiança dos sem-abrigo, mas que hoje em dia é visto como “um super-herói”.

…A nossa ideia é levar-lhes esperança na mudança

“Inicialmente, era apenas eu que saía à procura dos moradores de rua. Corria atrás deles, mas muitos estavam chateados e com medo, ainda por cima, tratando-se de um preto. O preto tem uma imagem desgastada na sociedade portuguesa. Comecei a escutar os seus problemas e tentar ajudá-los de alguma forma. Até que chegou um momento em que não conseguia viver sem eles e vice-versa”, diz.

Atualmente, tem um ponto fixo e conta com a colaboração de cerca de vinte pessoas. “Passei a incutir a ideia e o princípio aos meus funcionários e eles passaram a me ajudar.”

Para Dominick, o ‘Quintas-feiras Mágicas’ é mais do que uma ação social ou um ato de caridade. “Na minha perspetiva é uma grande festa que promovemos para as pessoas que estão abandonadas e esquecidas pela sociedade. (…) A nossa ideia é levar-lhes esperança na mudança”, explica e revela que há casos de pessoas que conseguiram sair das ruas e atualmente colaboram com o projeto. “Isso é extremamente gratificante.”

…A ideia para Cabo Verde é maior que transformar pessoas e vidas

Além de promover esse convívio, uma vez por mês, Dominick Donk encerra as portas das suas instalações para realizar o Dia da Beleza, dedicado às crianças, aos homens e principalmente as mulheres em situação de rua. “É um dia de transformação mais profunda. Tratamos do cabelo, mãos, pele, vestuário, banho, etc. Entram uma pessoa e saem outra.”

No futuro, o jovem empresário diz que pretende regressar ao arquipélago. “Não vim em busca de riqueza na Europa, mas sim de conhecimento e experiência. (…) Vim aprender com o intuito de voltar para mudar a realidade de Cabo Verde, juntamente com outros jovens cabo-verdianos nos quais tenho grande confiança e esperança. (…) A ideia para Cabo Verde é maior que transformar pessoas e vidas. É transformar a nossa nação numa nação próspera, educada, bem como salvaguardar a essência do povo, que é a nossa morabeza”, conclui.

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