Sandira Ferreira, a gestora que criou uma marca de lingerie inspirada na mulher cabo-verdiana

Pelas mãos desta praiense nascem peças íntimas que pretendem representar mais do que a sensualidade da mulher cabo-verdiana.

Natural da Praia, Sandira Ramos Ferreira, de 31 anos, é uma gestora cabo-verdiana que encontrou na costura uma ideia de negócio. Sozinha aprendeu a fazer peças de lingerie e agora vai lançar neste mês (março) uma marca própria. Em entrevista exclusiva ao Balai CV, a empreendedora diz que o projeto começou a ser idealizado no ano passado, mas a paixão pela modelagem vem desde criança.

“Sempre tive habilidade com os trabalhos manuais e o interesse pela área da moda. Lembro-me que em criança brincava com a minha vizinha de fazer peças para as bonecas. Infelizmente, não escolhi essa área, mas a modelagem sempre esteve presente na minha vida”, conta a jovem que é formada em Gestão de Empresas – Comércio Internacional.

Recorda que a primeira peça que costurou à mão, para uso próprio, foi uma saia de cintura alta.

“Em 2010, fui estudar na China. Certo dia, recebi um convite para ir a uma festa de comemoração da independência de Angola, não tinha o que vestir (risos) e decidi fazer uma saia com um tecido africano que uma amiga me trouxe de Uganda. Fiz a peça em algumas horas e lembro-me que a minha colega não acreditou que foi costurada à mão. Tenho a saia até hoje. Ou seja, sempre gostei de moda e sempre tive vontade de fazer algo. Inicialmente, pensei em criar uma marca de biquínis, mas vi que já havia algo do tipo em Cabo Verde. E como gosto de lingerie e peças íntimas para mulheres questionei-me: ‘Porque não?’”

No ano passado (2022), usou as suas economias para comprar uma máquina de costura, começou a praticar e a fazer retoques nas suas roupas. “Certo dia, comprei um pedaço de tecido de renda e tentei fazer umas cuecas, mas não gostei do resultado. Assisti vídeos na internet e continuei a praticar até conseguir.”

Inspirada na morna Miss Perfumado de B.Leza, que mais tarde foi eternizada na voz de Cesária Évora, Sandira decidiu criar a sua marca de lingerie feita à mão que batizou de Miss Perfumada.

“Achei a composição tão linda, simples e sofisticada. (…) Também houve um episódio engraçado que aconteceu em 2014 durante umas férias nas Filipinas. Estava sentada numa praia com alguns amigos e um grupo de japoneses estava a ouvir a morna Miss Perfumado. Para verem como a Cesária é grande e eternizou a música de Cabo Verde em todas as partes do mundo. Daí a escolha do nome da marca. A morna é Miss Perfumado e como é uma marca para mulheres pusemos Miss Perfumada. (…) Queria criar algo que tivesse uma estrutura que é uma bolsa reutilizável com o nome da marca, uma etiqueta que carrega o nome de Cabo Verde e as peças íntimas feitas à mão”, explica e diz que o seu maior exemplo de empreendedorismo é a mãe que, quando o pai emigrou à procura de melhores condições de vida, criou quatro filhos sozinha.

Encontrar matéria prima no país é o maior entrave para a jovem. “É complicado encontrar materiais de costura em Cabo Verde. A oferta é limitada, há poucas lojas e nem sempre encontro o que preciso. Por exemplo, coisas básicas, como é o caso da linha indicada na confeção de lingerie – não é a mesma usada em todas as confeções – ou a agulha para tecido de renda. Não há agulha 65 no mercado nacional. Tive que comprar nos Estados Unidos da América”.

No que tange aos tecidos, Sandira diz que alguns são comprados no exterior e outros no país. “Os tecidos de lingerie são os mais caros que existem, porque para além de serem de rendas são bordados. São os chamados tecidos luxuosos. (…) A bolsa para as peças foi feita fora do país, porque é difícil encontrar uma gráfica para imprimir com qualidade”, conta e diz que usa tecido de renda, cetim e tule para a confeção das peças.

Para já a marca Miss Perfumada tem disponível apenas dois modelos de lingerie: Conjunto de cueca e sutiã e conjunto de cueca, sutiã e cinta. “Peças como o body não comecei a fazer ainda porque exige mais materiais, mas é algo que estou a considerar fazer”, diz e conta que leva um a dois dias a produzir um conjunto. “Normalmente, faço em horário pós-laboral.”

Questionada sobre como é feito o processo de produção da marca, Sandira diz que primeiro compra os tecidos e depois adapta as modelagens aos tamanhos. “Há diferentes tipos de corpos e tento adequar à nossa realidade onde as mulheres têm corpos mais avantajados. Corto todas as modelagens nos tecidos, depois faço uma primeira costura à mão e só depois na máquina e no final coloco os acessórios que são o aro do sutiã, as alças e o elástico”.

O lançamento oficial da marca Miss Perfumada está previsto para este mês de março na capital do país, mas no passado dia 13 de fevereiro, em véspera do Dia dos Namorados, Sandira começou a comercializar algumas peças numa loja na capital.

“Venderam-se rápido e, surpreendentemente, quem as comprou foram apenas os homens. Fiz cinco conjuntos e deixei três na loja e esgotaram no dia seguinte. As outras peças vendi para amigos. Agora estou à espera de alguns elásticos para dar continuidade. Não uso qualquer tipo de elástico, primo sempre pela qualidade. (…) As peças são feitas com muito amor”, diz e realça que o feedback tem sido “espetacular”.

No que tange aos preços, o conjunto de duas peças custa 3500$00 e o conjunto de três peças varia entre 4200 a 4500 escudos. As lingeries encontram-se à venda na página do Instagram da marca, bem como na loja Lipstick CV no bairro de Achada Santo António.

Neste momento, Sandira está focada na produção da sua primeira coleção que pretende lançar brevemente no mercado. “Quero retratar a consciência, a cultura, o poder e a força da mulher negra. Mostrar que as mulheres podem fazer tudo. Compramos tantas coisas fora, mas temos capacidade de produzir no país”.

Dar mais oportunidade às pequenas marcas

Segundo a jovem empreendedora, a mulher cabo-verdiana tem capacidade para produzir vários produtos, mas que precisa de mais oportunidades para expor os produtos no mercado.

“A única coisa que gostaria era que as pequenas marcas tivessem mais espaço para expor os seus produtos, principalmente os que são feitos artesanalmente e que carregam uma história, muitas vezes de superação, subsistência e de sobrevivência. Acho que falta isso em Cabo Verde. (…) Acho que os pequenos artesãos têm muita dificuldade em expor os seus produtos. Marcas que não são conhecidas não têm palco. (…) Nunca se falou tanto no empoderamento da mulher como agora (…) mas ainda é preciso fazer mais”, diz Sandira e realça que este é o momento de mostrar a marca Miss Perfumada.

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