
Domingo, 24 de Setembro, 2023
Pescadores, peixeiras e armadores dizem que estão a passar por momentos difíceis devido à redução drástica e acentuada do pescado e alertam para os impactos no rendimento das famílias que vivem da atividade.
É com os primeiros raios de sol que dezenas de pescadores começam os preparativos para a faina que pode demorar entre cinco a sete dias em alto mar, na esperança de, recorrendo ao puro sentido cognitivo construído ao longos dos anos, conseguir peixe para a venda.
Várias são as iniciativas para melhorar as condições de trabalho de uma das profissões consideradas “mais arriscadas” do mundo que, entretanto, tem sido condicionada por fatores diversos, alguns dos quais se prendem com as alterações climáticas, a escassez do pescado e as despesas com a manutenção técnica dos barcos.
Factores que, alertam, têm culminado na diminuição do rendimento das famílias cabo-verdianas que se dedicam à preservação e vendas de peixes no Cais de Pesca na Cidade da Praia.
Ainda jovem, com apenas 16 anos, José António, hoje com 62 anos e proprietário do barco “Biscainha”, iniciou as suas aventuras no mar.
Segundo avançou, uma das maiores dificuldades que tem enfrentado, enquanto armador, tem sido encontrar as melhores soluções para resolver as pendências ligadas à manutenção do barco, lamentando que às vezes “não há dinheiro para arcar com as despesas” na reparação técnica, principalmente, do motor.
Conforme a mesma fonte, investem em média 200 a 300 contos nas saídas ao mar, sublinhando que, muitas vezes, voltam “de mãos a abanar” porque a “situação está difícil” e tem de ir às outras ilhas para pescar o pouco que conseguem, no total de 500 a 800 kg de peixe.
“Dá para vender e comprar um quilo de arroz e desenrascar com a família” elucidou, indicando que a “cavala” e o “txitxarro” (Chícharo em português) que antes custava apenas vinte escudos, hoje é vendida pelo preço mínimo de 100 a 200 escudos.
José António adiantou igualmente que outro desafio é a conservação do pescado, acrescentando que tem de pagar 50 mil escudos por três toneladas e meio de gelo e que ainda assim há momentos em que “o gelo termina e o peixe estraga”.
O pescador e armador Eugênio Gonçalves, carinhosamente apelidado de “Neno pescador” por familiares, amigos e colegas de profissão, indica que os meses Julho, Agosto e Setembro são as que verificam maiores níveis de pescado contrariamente ao mês de Maio em que raramente conseguem apanhar peixe.
No momento em que abordamos o entrevistado, este saiu do único barco que deu entrada no Cais da Praia com peixes, atraindo assim a atenção das peixeiras que se encontravam no local com as bancadas praticamente vazias.
Eugénio disse que, dependendo do combustível e da alimentação, podem ficar até um mês à pesca caso haja uma boa reserva, asseverando, no entanto, que o clima e o aumento das embarcações têm condicionado a apanha de peixe.
Para as peixeiras Maria Furtado e Auriza Monteiro, que faturavam diariamente entre dois mil a cinco mil escudos, atualmente ganham aproximadamente dois mil a três mil escudos e há dias em que voltam para casa sem o pão para os filhos.
“Com o aumento de preço no mercado, a esperança é o mar. Neste tempo de crise temos de enfrentar as dificuldades. Investimos até 500 contos e ficamos sem nada, eu particularmente tenho uma despesa de dois mil contos e o barco volta quase sempre vazio ao porto” lamenta Euriza, que começou a prática da atividade por falta de oportunidade.
“Sou de Santiago, às vezes temos semanas sem peixe. Antigamente os ganhos de peixe dava para muita coisa, hoje serve apenas para alimentar a família”, reclama Maria Furtado, apelando ao apoio das autoridades porque “só o mar não chega”.
Inforpress
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