
Sábado, 2 de Dezembro, 2023
A serenidade pode ser apontada como uma das características do povo moçambicano. Tenho aprendido muito com isso, moderando a minha frontalidade de mulher do Fogo.
Tudo isso para dizer que não fiquei surpresa com as manifestações de rua das recentes eleições autárquicas.
Contestações iniciadas logo depois do encerramento da votação, intensificaram-se três dias depois da divulgação dos resultados preliminares, apresentadas pelas Comissões Distritais, que deram vitória à FRELIMO, partido que governa o país, desde a independência em 1975 e vence as eleições desde a abertura do país ao sistema multipartidário, há 41 anos.
Desta vez venceu em 64 dos 65 círculos eleitorais, que nestas eleições contaram com mais 12 novas autarquias do que em 2018.
Os milhares de moçambicanos que têm saído à rua, sobretudo em grandes províncias como Maputo, Quelimane, Nampula e Beira, dizem que a razão está do seu lado e que os resultados não espelham a sua vontade. Pessoas convictas e mobilizadas pelos dois partidos da oposição, a RENAMO, segunda força política que ficou de fora do poder autárquico, perdendo as 8 autarquias e o MDM, que manteve o resultado de há 5 anos, continuando a governar a Beira, capital da província de Sofala, a segunda maior cidade depois de Maputo.
Os líderes dessas duas forças políticas falam “das piores eleições já organizadas”, de suspeitas de fraude em vários círculos e pediram recontagem e anulação dos escrutínios. Mas as suas razões não foram escutadas por quem é o fiel das razões: os tribunais.
Os que saem à rua e que prometem continuar a luta para a “justiça eleitoral”, dizem que as marchas e manifestações são pacíficas e têm um único objetivo: repor a verdade eleitoral. Mas não é isso que tem acontecido. Na última demonstração de rua, dezenas de manifestantes convictos das suas razões ficaram feridos e 70 foram presos e as associações de direitos humanos clamam para que sejam libertados.
A polícia veio à rua em força, acompanhada de militares em carros blindados, logo após a divulgação dos primeiros resultados. Empenhados em defender a ordem, justificam o recurso à força e ao gás lacrimogéneo porque os manifestantes incendiaram pneus, caixotes de lixo e atiram pedras.
Os manifestantes acusam a polícia de uso abusivo de força. A polícia e militares dizem que estão a defender a ordem.
No meio desta puxa de razões, há os que preferem ficar em casa. Não marcaram o dedo indicador com a tinta indelével e nem vão aos protestos de rua. Têm outras convicções. Dizem que já antecipavam a vitória da FRELIMO e estes resultados.
A abstenção variou muito de província para outra, nestas eleições. De um total de 4.8 milhões de eleitores, chamados a escolher os representantes municipais, em algumas chegou a ser quase 4 em cada 10 que recusaram ir às urnas. No perfil traçado pelo Instituto de Estudos Sociais e Económicos, o maior grupo abstencionista em Moçambique são os mais jovens, menos integrados social e politicamente na vida do país. A esta lista eu acrescentaria os que estão convictos que nada irá mudar.
Por fim, poderia ser também no início, ou talvez no meio da minha lista, há aqueles que pouco falam e não se manifestam. Estão convictos da vitória. Mas não saem à rua para celebrar e fazer a festa.
"Ao longo das últimas duas décadas a escrita televisiva ocupou grande parte da minha vida profissional enquanto jornalista. A obrigação diária de poupar nas palavras deixou em mim a vontade de libertar no vento tudo o que guardo no peito".
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